Há dez anos, Mark Zuckerberg, então na universidade, lançou um
site
para os alunos de Harvard. Hoje, a rede social é usada diariamente por 757
milhões de pessoas em todo o mundo. Em Portugal, é, de muito longe, a rede
social mais popular: 77% de todos os utilizadores de Internet têm uma conta no
site
(há cerca de quatro anos, este valor rondava os 50%). Quase dois terços dos
utilizadores têm pelo menos 200 amigos. A segunda rede social mais popular, o
Google+, está distante, atraindo apenas 11% dos cibernautas.
Os dados são do Observatório da Comunicação e do
Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE, em Lisboa, e fazem
parte do projecto A Sociedade em Rede em Portugal: Uma Década em Transição,
coordenado pelos investigadores Gustavo Cardoso e António Firmino da Costa. As
conclusões serão publicadas dentro de alguns meses. Foram inquiridas, no ano
passado, 1542 pessoas, a partir dos 15 anos. A amostra deixa de fora parte dos
adolescentes, grupo que se tem dito frequentemente estar a desistir do
Facebook, embora os números se refiram quase sempre aos EUA.
Cá, a curva de idades na rede social acompanha a do acesso à Internet: 55%
têm menos de 35 anos. A partir dos 55 anos, é drástica a quebra de utilização.
Se se tiver em conta o universo de utilizadores de Internet que inscritos em
redes sociais, o domínio do Facebook é ainda mais expressivo, atingindo 98%.
Novamente na segunda posição surge o Google+ (13,7%).
Qualquer pessoa que vá ao Facebook está familiarizada com os múltiplos usos.
Serve para partilhar fotografias, pensamentos, episódios do quotidiano, artigos
de jornais e piadas. Permite trocar mensagens com amigos. E quase parece ter
sido concebido para comparar a respectiva vida com a dos outros (há alguns
anos, um estudo publicado numa revista científica de psicologia referia que as
redes sociais podiam levar as pessoas a sobrestimar a vida dos outros e, por
comparação, levar a que cada um se sentisse pior com a sua própria vida).
Em Portugal, os números daquele projecto de investigação mostram que muitos
usam o Facebook também como uma plataforma de participação cívica: 45% já
apoiaram uma qualquer causa nacional, mesmo que tenha sido apenas com um “gosto”,
que se tornou o equivalente digital de um cartaz de protesto ou de uma palavra
de ordem nas ruas. Quase um terço comentou as políticas do Governo. E perto de
um quarto dos utilizadores disse bem ou mal de figuras públicas.
O “café da esquina”
Apesar da popularidade, o Facebook não foi o primeiro
site do género,
lembra Gustavo Cardoso. “Enquanto conceito, não teve nada de novo”, mas
conseguiu um “aperfeiçoamento tecnológico” que lhe permitiu executar melhor a
visão de uma rede de ligações pessoais assente na Internet. Os antigos
concorrentes, como o Hi5 e o MySpace, estão quase esquecidos.
Porém, diz Cardoso, o Facebook não é um produto tecnológico, como, por
exemplo, o motor de busca do Google, em que a qualidade determina a
popularidade e a quota de mercado. O efeito de rede, sobretudo o de uma rede
gigante como esta, é um factor crucial a dificultar a chegada de novos
concorrentes. “Ao pôr as pessoas a falar umas com as outras, pode criar-se um
monopólio. A rede maior é aquela que oferece mais pessoas. É por isso que os
mercados das telecomunicações são regulados”, explica, fazendo uma analogia com
os telemóveis: tal como é conveniente ter a mesma rede de telemóvel que as
pessoas com quem se fala mais, também numa rede social online as pessoas querem
estar onde todos os outros estão.
Já Armando Alves, responsável pelos media sociais na agência de marketing
Fullsix, afirma que a popularidade, bem como o desempenho financeiro recente,
mostram que o Facebook tem “mais de dez anos” pela frente. Em 2013, a empresa cresceu
dois dígitos em quase todas as métricas. O número de utilizadores aumentou 16%
ao longo de 2013 e as receitas subiram 55%, atingindo 5600 milhões de euros.
Aos números contrapõem-se as histórias sobre pessoas cansadas da
conectividade constante, que vão surgindo nos media e nas conversas, embora não
sejam sustentadas por estudos que mostrem um fenómeno de larga escala. Armando
Alves diz que, apesar dos relatos, a generalidade das pessoas gasta cada vez
mais tempo na plataforma. “Toda a gente diz que não vai lá, mas a tendência é
para aumentar o número de horas que lá passam”. Admite, contudo, que nos mais
novos pode haver um recuo: “Os segmentos mais jovens têm acesso a novos canais
e têm mais conhecimento tecnológico, o que faz com que reduzam o tempo no
Facebook. Mas isso não quer dizer que este perca importância.” A plataforma é
um pouco “como o café da esquina” — toda a gente lá vai.
A este propósito, Gustavo Cardoso nota que o Facebook introduziu uma
“obrigatoriedade de partilhar, de dizer alguma coisa”, que pode causar cansaço.
Mas isto não tem de ser sempre assim, argumenta, recorrendo a mais uma analogia
com os telemóveis. “No início, as pessoas achavam que tinham de atender quando
alguém lhes ligava. Isso mudou e as pessoas desenvolveram estratégias de
contactabilidade” — o mesmo é dizer que passaram a ignorar algumas chamadas.
Com o Facebook, poderá passar-se o mesmo: cansados de um imperativo de
partilha, os utilizadores farão um uso diferente da plataforma.
Os próximos dez anos
O Facebook tem planos para se tornar ainda mais embrenhado na vida quotidiana.
Numa entrevista recente à revista americana Business Week, Zuckerberg dá pistas
sobre o futuro. Uma das ideias é usar os contactos de cada utilizador para
extrair a informação mais relevante para cada um, em cada contexto e em cada
momento. As pessoas já frequentemente colocam no Facebook perguntas que antes
eram quase um exclusivo do Google: “Qual é o melhor restaurante em Lisboa?” ou
“que computador devo comprar?”, por exemplo. Zuckerberg diz que a plataforma
deve facilitar o acesso a este tipo de informação. Se alguém de estiver de
visita a Lisboa, os algoritmos que seleccionam o que é mostrado a cada pessoa
deveriam privilegiar informação útil para quem está de passagem pela cidade.
Tirando isto — que faz concorrência ao objectivo do Google de organizar toda
a informação do mundo, embora com uma abordagem diferente —, Zuckerberg disse à
Business Week que não quer entrar no mesmo terreno que os outros
gigantes da tecnologia. Não pretende desenvolver sistemas operativos, nem
telemóveis ou
tablets, como fazem a Apple e o Google, nem quer criar
enormes centros de dados para vender serviços de armazenamento e computação,
como a Amazon.
Uma coisa que o Facebook quer, no entanto, é
alargar o acesso à Internet. Juntou-se a outras empresas, entre as quais
pesos-pesados como a Samsung e a Nokia, para um projecto chamado Internet.org.
O objectivo é reduzir o custo da Internet em telemóveis e conseguir assim
chegar aos países em desenvolvimento, onde o potencial de crescimento é muito
maior. Em dez anos, o Facebook tornou-se um elo de ligação para um em cada sete
habitantes do planeta. Faz sentido que queira também ligar o resto.